sexta-feira, 17 de abril de 2009

Ainda

Ainda dói um pouco, mas nada tão insuportável assim. Sabe, com o tempo a gente acostuma. Já passaram quase três anos, estou quase cem por cento. No começo eu fazia coisas absurdas, como uma vez, logo quando aconteceu, lembro que peguei a camiseta que eu estava usando no dia do acidente e preguei na parede como se fosse um quadro, bem do lado da minha cama. Foi pra eu poder sentir o cheiro de Carolina, que ainda estava naquela camiseta. Deixei pendurada ali por um bocado de tempo, e mesmo quando o cheiro já tinha saído, eu imaginava que ainda estivesse lá, pelo menos alguma coisa que restou do cheiro que meu nariz não pudesse mais sentir. O que importava é que estivesse lá. Inventava também outros pretextos, como o fato de ter sido a última camiseta que usei ao lado dela, ou saber que suas impressões digitais estivessem impregnadas no tecido, e várias outras coisas assim.
Já procurei outras mulheres, mas nenhuma tem o gosto igual. Algumas têm os lábios maiores, já outras, lábios menores. Umas têm peitos mais pontudos, mais suaves, com mamilos pequenos ou de qualquer outro jeito, mas a verdade é que nunca são iguais. Sempre falta algo. A última com quem saí, por exemplo, me decepcionou quando tirou os sapatos. Não tinha cheiro ruim nem nada, mas era o formato que era estranho. Carolina tinha o pé perfeito, de verdade mesmo, eu não conseguia enxergar nada de errado com o pé dela. Mas essas outras sempre têm alguma coisa que me incomoda.
Lembro que eu costumava contar tudo a ela, cada mísero detalhe dos meus dias. Mesmo que não tivesse nada de interessante, ela me escutava sempre. Eu também escutava quando ela contava dos seus dias, mas a diferença era que os dela eram realmente interessantes. Sabe, ela costumava ler muito, gostava muito de livros de amor, mas ela nunca lia os finais, nunca mesmo. Dizia que assim ela podia criar o final que quisesse, ou então fazer com que a história durasse para sempre, como uma história sem fim. Além disso, ela também dançava, e estava ensaiando para uma peça musical. Tentou convencer o autor da peça a não mostrar o final no dia da apresentação, mas não deu muito certo. Nem todo mundo iria entender o motivo. A verdade é que ninguém nunca entende nada, isso é o que acontece.
Um pouco antes da tragédia, a do acidente de carro, a gente tinha brigado e a última coisa que lhe disse foi “te odeio”. Quero me matar por ter dito isso. Quando finalmente me arrependi e liguei no celular pra pedir desculpas, ninguém atendeu. Então liguei em sua casa, e uma voz de choro me deu a notícia do acidente. Nunca mais vou poder pedir desculpas, nem falar que eu nunca a odiei, muito menos dizer que não existe ninguém no mundo que tenha o pé igual ao dela, e além disso, ela nunca soube do anel que eu havia comprado naquele dia. Iria pedir sua mão em casamento, mas não deu. O carro caiu numa ribanceira quando ela estava voltando pra sua casa, depois da briga que tivemos aqui. No final deu que o carro pegou fogo, e ela morreu assim.
Se nunca tivéssemos brigado, ela nunca teria ido embora, e não haveria nada disso. O que eu quero dizer, é que se algum dia me aparecer uma mulher tão perfeita quanto ela, o que eu estou começando a acreditar que é impossível, eu nunca vou brigar, nunca mesmo. Mesmo que eu esteja certo, vou ceder minha razão, assim ninguém vai cair na ribanceira, e quem sabe um dia alguém possa receber o anel que estou guardando há tanto tempo. Ainda espero.

17 comentários:

  1. Lucas^, QUE LINDO!!!
    Me emocionei, ta lindo de mais,esse conto mostra qe nunca sabemos o dia de amanha e devemos viver intensamente o dia de hoje, deixando as brigas e picuinhas de lado!
    te adoro muito bom fim de semana!
    BEIJOS

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  2. Nossa, adorei o post...
    [é preciso amar as pessoas com se não houvesse amanhã....]

    Adorei seu blog!
    Ah, seu eu gosto do Camelo?
    rs..sou viciada!

    bjo grande

    até

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  3. Há amores que permanecem. Tens bonitas palavras aqui, bonitos sentires apesar da tristeza que carregam. *

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  4. ... "Mesmo que não tivesse nada de interessante, ela me escutava sempre. Eu também escutava quando ela contava dos seus dias,"...

    Se fosse os "pés" que nos fizesse sentir falta das pessoas....o ser escutado,....o escutar...a cumplicidade....

    Belo texto

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  5. Que conto tenso, Lucas. Muito forte e triste, e bem verossímil (caso não tenha sido um relato).

    Gosto, viu?
    Abraço!

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  6. -

    Seu texto me fez pensar.
    Brigamos tanto, e por tão pouco.


    Tenha um bela noite
    Até logo :*

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  7. Que lindo... :)

    Adorei o teu blogue! Parabéns :)

    Não sei o que é fazer parceria de links! Desculpa a minha ignorância :) Explica por favor :)

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  8. com o tempo a gente aprende a dar valor nas coisas certas e deixa de brigar por qualquer coisa, principlamente com aqueles q tanto amamos.

    as vezes chacoalhadas assim servem pra dar novo sentido à vida.

    beijos

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  9. Eaeh Lucas!
    Me impressiona a qualidade dos seus contos, muito bons mesmo!
    Será uma honra trocar links com vc!
    abraçO

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  10. Primeira vez no blog, então espero que seja uma crônica apenas, sem fatos reais, se for, vc escreve muito bem menino...

    PS: sobre seu coment, no meu blog, como assim parcerias?

    beijos

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  11. Lucas, isso me doeu feito ferida verdadeira... É dessas que ainda sangra no peito??

    Não posso dizer que o texto é bonito... O máximo que consigo é um "Crônica bem escrita". Desculpa.

    Beijos!

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  12. Adorei seu jeito piega de escrever...adorei seu amor insuperavél...adorei suas desculpas, pois existe pessoas perfeitas como ela sim! só que ela era muito especial para vc então vc nunca irá superar a perca...mas espero no fundo do coração que consiga amar de novo...
    Bjus da Loloh

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  13. Não falou "Nunca mais vou poder pedir desculpas, nem falar que eu nunca a odiei, muito menos dizer que não existe ninguém no mundo que tenha o pé igual ao dela, e além disso, ela nunca soube do anel que eu havia comprado naquele dia" porque para ela a história de amor de ambos ainda não terminou!

    LINDOOO O TEXXTO!
    Tô até emocionada! rs

    Se cuida Lucas!

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  14. lucas brigaim pela visita.

    e este texto, hem? muito bom. as coisas são iguais aqui como aí...

    abs
    marcos

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  15. nossa, encantador.
    descreveu o amor de uma forma tão nova!
    descreveu assim nos mais puros detalhes, acho digno, muito mesmo.

    Foi até bom ler, assim vou fazer o mesmo.
    Sempre mesmo que com raiva dizer o teamo.

    Obrigada por me proporcionar uma leitura tão agradavel.

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